segunda-feira, 31 de agosto de 2015

Cara ou Coroa?

Quando alguém nos pergunta "cara ou coroa?" para decidir alguma coisa, e apostamos numa das faces da moeda, todos nós, bem lá no fundo, sabemos o que queremos que saia, e nem sempre desejamos ter sorte. Pelo menos esta é a minha teoria, comigo funciona assim.

Se escolhêssemos a especialidade atirando a moeda a ar, por exemplo: "se for cara vou para cardiologia, se for coroa vou para cirurgia geral", no último segundo antes da moeda pousar, teríamos escolhido algo na cabeça e estaríamos a torcer por algum dos lados. Em última análise, atiraríamos mais vezes a moeda ao ar, "só para ter a certeza", ou para confundir mais as probabilidades (que serão, claro está, sempre 50%/50%).

Ora, a questão "para que especialidade vou?" já está respondida. Agora surge outra: "para onde?".
Quando já se pensou e repensou milhões de vezes sobre o assunto, já se pediu opiniões a dezenas de pessoas, já se contactou os internos mais velhos dos respetivos lugares de indecisão para saber informações, até já se fez estágios em alguns desses serviços, já não resta muito mais que se faça. Os mais relaxados dizem-me "oh não te stresses, ainda faltam 3 meses...". Os mais parecidos comigo dizem "epah pensa bem, já vi muita gente a chorar antes e depois da escolha...pensa bem o que queres...e não deixes para a última".

Bem, uma verdade é certa "pessoas com nota mais alta que tu vão ajudar-te a decidir...". Não tenho nenhum 90%, por isso muitos irão escolher Psiquiatria antes de chegar o meu dia. Ou seja, é verdade que há sempre uma parcela, e bem grande, de imprevisibilidade. Mas dentro daquilo que eu posso efetivamente escolher, quero ter esse poder e esse controlo sob a minha vida bem ciente. Segundos depois da vaga estar selecionada, já nada se poderá fazer.

Decisões extremas, medidas extremas.

Vai parecer estúpido a alguns (a esses, caros amigos, sintam-se completamente à vontade para terminar a leitura do post aqui), mas poderá ser útil a alguns, poucos que seja, já vale a pena correr o risco e partilhar.

Fiz uma lista das 10 coisas que são importantes para mim nestes próximos 5 anos da minha vida, como me quero ver e coloquei numa coluna. Alguns exemplos: "Viver perto da minha família", "Ter urgências somente das 8-20h", "Ter boa formação académica." Ordenei-as desde a mais importante (10) à menos (1). Selecionei o meu top3 de cidades/serviços, e escrevi-os em 3 outras colunas. Depois foi só atribuir pontos 3-2-1 (ou zero, no caso de não se aplicar; por exemplo, é impensável fazer SU só das 8-20h em Coimbra, enquanto que em Aveiro é certo, visto que só há SU nesse período).

No final somei tudo de duas forma: a soma direta dos pontos e a soma dos valores que se obtiveram com a multiplicação dos pontos pelo fator de importância.
Obtive a mesma ordem das duas formas. E mais curioso ainda...lembram-se da questão da moeda ao ar? Se atirassem a moeda para decidir os locais, no ultimo instante, olhando só ao coração, eu sei o que eu queria que saísse...E foi o que deu.

Pode ter sido só uma estupidez, pode ter sido uma coincidência, mas sempre ajudou a ter a imagem grande das coisas. Porque quando se analisa os pormenores, como eu estava a  fazer, aparecem os "ses" e "mas", mas o que importava era ver o seu conjunto e saber onde há maiores vantagens.

Talvez se possa aplicar algo semelhante para a escolha das especialidades, para os ainda indecisos nessa matéria.

segunda-feira, 24 de agosto de 2015

Cirurgia

Comecei no início de Agosto o estágio de cirurgia e fiquei no bem-aventurado grupo de mama e endócrino. Pessoas super simpáticas, o que é sempre essencial para mim.

Na primeira semana andei melancólica, a repensar a minha escolha profissional. Mais um pouco de dúvida patológica e ainda me auto-diagnostico como obsessiva.
É que por cá deixam-nos (a nós, simples IAC's) entrar nas cirurgias, nem que seja só para segurar o aspirador. E todo aquele ritual de lavagem, aquela dança cuidada de mãos no ar para vestir a bata sem nos contaminarmos, e aquelas roupas verdes trazem o sua charme e dramatismo à questão. De repente, estar a ouvir as colegas de Obstetrícia falar deste e aquele casos na sala do intervalo, já não me era 100% indiferente. Fiquei desconfortável. Cirurgia tem tanta piada...

Na semana seguinte já tudo me parecia sem grande cor, e as constantes dores por contracturas musculares das cirurgias começam a aparecer...ou eram as pernas, ou a coluna lombar, ou os ombros... Nessa quarta-feira, ouvir as colegas falar dos partos não me fez sentir nada, estava indiferente. Acho que aquele primeiro impacto foi o mais forte, porque já há mais de um ano que não entrava num bloco... Parecia o reviver de uma paixão duvidosa. Mas é bem verdade quando dizem que o verdadeiro amor é aquele que fica mesmo depois da paixão diminuir. Cá fiquei eu, mais convicta que nunca de que tenho a decisão tomada por amor à especialidade, e não por conveniência ou outra coisa qualquer.