segunda-feira, 26 de janeiro de 2015

"Vais repetir exame?"

Cara colega,
Bem haja pelo teu comentário!
Sinto o mesmo medo que tu é tenho uma nota no mesmo patamar que tu...uma nota que parece estupida deitar fora, mas "faltava uma danoninho" para alcançar o objectivo... Publicaram agora há pouco no facebook que teremos até final de fevereiro para desistir do ano comum..e penso, caso seja verdade: " estou em mgf, queria fazer psiquiatria em abril antes de decidir...como faço agora?" Também nunca pensei que não conseguiria, confesso. Estava super traçado que iria ser obstetra e como isso estava tão bem definido em mim, nunca sequer me permiti gostar de mais coisas (à excepção da psiquiatria). Isso também te aconteceu?
Agora acho que estou a passar por uma mudança profunda de identidade. Estou a deixar de estar tão apegada ao que "sempre quis" para permitir a abertura ao que "posso fazer com esta nova e diferente realidade".
 Bem, estou no estágio no mgf, como já te disse, e eu que nunca antes tinha gostado, agora estou a gostar de verdade...não pelo desempenho médico apenas que é possivel, mas pelo pacote inteiro. Acho que devemos pensar como adultos, e a verdade é que em tudo há vantagens e desvantagens... Repara neste exemplo: se eu decidir ir para mgf, terei um treino em todas as áreas da medicina..isso pode permitir-me fazer voluntariado em missões humanitarias como sempre quis...posso ter a certeza que terei os fins de semana para a família... Visto assim, pacote completo, parece perfeito a mim, a vida que quero ter. Se for para psiquiatria, posso abrir uma clínica que englobe psicoterapias e medicina convencional, como acho que faz sentido, posso ter uma carreia hospitalar... Etc etc etc.
O que te quero dizer, é que acho que a abertura é o mais importante. Fecha os olhos e vê o que queres ser daqui a 5 anos. Entretanto, se quiseres repetir, não te deixes vencer pelo medo. Também tudo poderia ter corrido pior este ano...se repetires, já sabes o que encontras, tenho a certeza que estarás até mais calma. Sei de casos de pessoas que foram repetir exame com notas superiores a 76.

 O que eu vou fazer?
 Esperar saber se teremos mesmo de desistir até fevereiro. Se assim for, vou fazer o que te disse para tu fazeres: vou fechar os olhos e ver quem quero ser, não só como médica, mas como mulher, como filha, como irmã, como amiga de muitos amigos, como sonhadora, como tudo, absolutamente tudo o que sou...não é porque tiramos o curso de medicina que passamos a ser só medicos...somos sempre mais.

Boa sorte!!!

quinta-feira, 15 de janeiro de 2015

Interna do Ano Comum - a nova etapa

Todo o mar tem as suas horas de maior tormenta. A revolta, a sensação de injustiça, a ira, as fortes sensações, e porque somos animais e frutos da evolução, ativam as nossas amígdalas cerebrais (o "centro emocional") e, de repente, o fluxo sanguíneo deixam de irrigar tão intensamente o cortéx pré-frontal ("o centro racional"). Isto acontece para não deixarmos que o pensamento nos torne "vulneráveis" ao senso comum, e consigamos reagir sem pensar. É uma protecção muito, muito antiga. Péssima, na maioria dos casos, hoje em dia, eu diria. Acho que permaneci nesse estado de "inconsciência irracional", chamemos-lhe assim, durante estes últimos tempos. Ao começar o Ano Comum, falei com imensas outras pessoas que, tal como eu, dia 20 lá estiveram. Correu mal a muitos, correu bem a muitos. As estratégias de estudo foram as mais variadíssimas e há imensos colegas que repetiram o exame e que estão a reiniciar o Internato agora. Isto deu-me uma perspectiva mais afastada. Quando nos afastamos de uma determinada realidade, conseguimos ver mais coisas. É como quem olha fixamente e muito próximo para uma palavra de um livro. Se nos distanciarmos (e aqui esta palavra ganha uma conotação emocional), conseguimos ver toda a página, e aquela palavra que não fazia qualquer sentido, de repente tem contexto um contexto, um enquadramento. Portanto hoje, se tivesse de começar a estudar para repetir o exame faria diferente. Há sempre alguma coisa que podemos mudar e foi a minha revolta que não me deixou ver isso, ser humilde. Acho que chamamos a isso em gíria "orgulho ferido". À parte disso, ser interna do ano comum é uma sensação totalmente nova. Finalmente livramo-nos daquele título de "estudante de medicina" que por vezes não agrada aos doentes. Agora somos "médicos" e, como tal, acho que há uma abertura diferente. Comecei com o estágio de Cuidados Primários de Saúde, que engloba 3 dias de Medicina Geral e Familiar e 2 dias de Saúde Pública por semana. Tem sido gratificante saber que estou a trabalhar de verdade, que estou a ganhar dinheiro. Não fiz férias depois do harrison, mas sinto que finalmente agora estou a relaxar mentalmente (não pela falta de trabalho), mas por ter a cabeça realmente ocupada em coisas úteis. Deixei de remoer. Ganhei uma outra força. Aprendi com os muitos colegas mais velhos que conheci que repetiram o exame. Tracei uma estratégia.