sábado, 19 de maio de 2012

Inverter a morte?!

Nunca tinha escrito sobre o este caso, porque não queria que pudesse sequer existir a mínima hipótese de ele ser reconhecido, mas agora que já se passaram alguns meses, e uma vez que o seu nome não é revelado, creio que posso finalmente partilhar uma experiência deveras diferente.

Não me lembro ao certo do dia... Sei apenas que estava a fazer o meu turno de voluntariado na Cruz Vermelha quando recebemos uma chamada: era para um senhor entre os 60-70 anos, com dispneia (dificuldade em respirar).
Saímos a correr, tal como já é hábito, e a ambulância deu tudo quanto podia dar na estrada. Chegamos em 15 minutos, um exagero brutal, devido ao trânsito pouco colaborante de Coimbra.
Quando encontramos a vítima, já lá estava a VMER (viatura médica de emergência e reanimação) e a médiao e o enfermeiro contavam já com cerca de 10 minutos de compressões cardíacas e insuflações, sem qualquer sucesso. Foi injectada a epinefrina habitual e continuaram as compressões...
Eu, meia parada num canto para não atrapalhar naquele cubículo que chamavam de quarto, sou de repente chamada a "trabalhar"... Fiz 3 ciclos de compressões e 2 de insuflações...Nada resultava...
Entretanto a médica mandou parar, tirou um novo traçado de ECG, e alinha vinha isométrica. Foram avaliados os sinais vitais - não existia pulso ou respiração espontânea. Foram chamadas as autoridades e o delegado de saúde. Passado pouco tempo, estava oficialmente declarada a morte daquele pobre homem...

Durante alguns dias, em momentos de maior distracção, lá pensava naquele aparato todo, mas tentativas frustradas de salvar um homem... Enquanto fazia compressões, queria incrivelmente que ele respondesse, mas sabia dentro de mim que isso já não iria acontecer... tive a sensação de estar a tentar salvar um cadáver. E só pensava "pobre homem..."
Morreu rodeado pela família...Estavam todos na sala, à espera de uma boa notícia, mas não sei se teve tempo de se despedir...

Hoje, quando relembro o acontecimento e o partilho, só consigo pensar no quanto devemos tentar ser felizes e completos... a vida é efémera e nem nós, aspirantes de medicina, nem os médicos já com imensos anos de carreira, podem mudar isso.

5 comentários:

  1. Olá J. Castro
    Sou uma aluna do 11º ano em Coimbra.
    Gostava de te fazer uma pergunta algo pessoal.
    Certamente acabaste o ensino secundário com uma excelente média, não é qualquer um que entra no curso com a média mais alta do país.
    É natural que passasses algum tempo a estudar, tivesses com atenção nas aulas, tivesses interesse em estar atenta àquilo que os professores diziam etc...
    Mas como disse no início, presumo que tenhas tido sempre boas notas no secundário.
    A verdade é que, modéstia à parte, eu sou a única da minha turma que tira boas notas, tudo o resto, quase, está-se completamente a marimbar para tudo, faltam às aulas, vão para a rua, desrespeitam os stõres, etc, e até já me chamaram de "a rapariga esperta e esquisita da pior turma do 11º ano". Alguns colegas já me disseram até que eu destoava aquela turma por tirar boas notas e que se calhar era melhor mudar para outro no próximo ano, não me querem ali por nada. E, claro, é um pouco difícil arranjar amigos nestas circunstâncias.
    Aquilo que te queria perguntar era o seguinte: alguma vez sofreste algum tipo de discriminação devido aos teus bons resultados? Já alguma vez, por exemplo, te chamaram "maluquinha" por quereres entrar em Medicina e acharem que te estavas a gabar? Se já foste "excluída" de um grupo de amigos apenas por teres boas notas e te acharem esquisita?
    Entendo que é uma questão pessoal e que te podes sentir pouco à-vontade a responderes e mostrares a todos, por isso se quiseres envia a resposta para o meu e-mail:
    mark.super.1@hotmail.com

    Bjs. e parabéns pelo blogue.

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    1. Olá querida!

      Prefiro responder por aqui, porque a tua dúvida pode ser a duvida de mais pessoas, com menos coragem que tu para a fazer.

      Bem, eu não sei se já escrevi isto noutras ocasiões ou não, mas a verdade é que não nasci com o sonho de ser médica. Nasci com o sonho de ajudar as pessoas. Primeiro quis ser professora, depois farmacêutica e só no 12º ano abracei a Medicina. Apesar de saber que andava meia incerta, sabia que queria saúde. Por isso o meu lema sempre foi "tirar o mais alto que puder, para depois puder escolher o que quiser".
      E assim foi. Quando pensei em Medicina, já trazia na bagagem uma média boa. Depois foi só manter nos exames nacionais e candidatar-me. Entrei em Medicina para ser "Medica sem Fronteiras" e é esse o objectivo maior, ainda que no futuro possa não ser exactamente isso a passar-se.

      Mais concretamente sobre o que me perguntas: Eu sempre estive rodeada por pessoas que me acompanhavam... (sempre soube escolher amigos que fossem parecidos comigo... As diferenças fazem bem, fazem-nos crescer, mas os valores têm de ser iguais, semelhantes, senão não há uma base sólida na relação, seja de que tipo for).
      No secundário, namorei com um rapaz que era muito aplicado, entendíamos ambos que tínhamos de ter tempo pra namorar e para estudar. Ajudavamo-nos um ao outro. Entramos os dois em Medicina, embora em faculdades diferentes. Os meus amigos entraram todos na faculdade e eram aplicados, apesar de não terem excelentes resultados...
      Acho que nunca me deparei com um situação parecida à tua. Mas aconselho-te, caso seja possível, a mudares de turma; não para fugires deles, mas para encontrares outros amigos, conheceres outras pessoas que te façam sentir bem pelo aquilo que TU és, e não pelo aquilo que a maioria é, na qual tu não te enquadras.
      Caso não seja possível, deves lembrar-te sempre do teu objectivo máximo: tu sabes o que queres, tu lutas por isso, tens uma meta traçada.. Eles falam, eles faltam, porque estão perdidos. Não deves fazer disso um motivo de presunção, mas não podes de todo, sentires-te rebaixada por isso. Acho aliás muito louvável!
      Actualmente passasse-se algo semelhante: dou-me bem com toda a turma e com as pessoas do curso em geral, mas os meus amigos, o meu "grupo", são 5 pessoas que tal como eu, gostam de se divertir, mas sabem quando têm de estudar, são responsáveis, têm objectivos, etc... =P

      Temos de saber enquadrar-nos no mundo e encontrar o nosso canto. Cada um deve seguir o seu caminho e tentar ser feliz. Se entrar em Medicina te fará feliz, então não desistas. Espero ter ajudado. Qualquer coisa, volta a perguntar!
      Beijinho de boa sorte

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  2. Julia, a mim ja me aconteceu isso, principalmente no inicio do 10ºano.Chamavam-me de "marrona" e isso tudo e tentavam rebaixar-me. Agora tou no 11º e as coisas tao mt melhores pq entraram melhores alunos, mas vejo que quando digo que quero entrar em medicina, alguns ficam sempre com uma pulga atras da orelha. Mas olha "caga" neles, para usar o termo preciso xb. Se eu fosse a ti mudava de turma. Eles simplesmente veêm uma pessoa a tirar boas notas e a querer entrar em medicina e ficam com inveja.

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  3. Olá J. Castro :)
    O meu nome é Cristiana e descobri o teu blog por acaso, e do que já li, acho verdadeiramente fantástico tudo o que fazes.
    Eu também sou estudante de medicina em Coimbra, no 2.º ano, e queria saber se os próximos anos serão melhores. Tenho andado desmotivada, e já pensei em desistir do curso, mas sou como tu e citando-te "não nasci com o sonho de ser médica. Nasci com o sonho de ajudar as pessoas. (...) Apesar de saber que andava meia incerta, sabia que queria saúde. Por isso o meu lema sempre foi "tirar o mais alto que puder, para depois puder escolher o que quiser".
    E assim foi. Quando pensei em Medicina, já trazia na bagagem uma média boa. Depois foi só manter nos exames nacionais e candidatar-me."
    E eu quero mesmo fazer a diferença na vida das pessoas!

    Outra coisa, que queria perguntar é: como é que tens tempo para tudo? xD é que eu sou da zona de santa maria da feira e aos fins de semana vou para casa e eu também estou a pensar em tornar-me voluntária na cruz vermelha, e fazer outra série de coisas relacionadas com isso... mas por outro lado sinto falta da minha família e etc. Como conseguiste gerir tudo isto + estudar para todas estas cadeiras? x)

    Beijinho e parabéns pelo teu blog ;)

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    1. Olá Cristina!
      Sê bem vinda!

      GARANTO-TE que vais adorar os próximos anos! Se gostas de Medicina e do contacto com as pessoas, já não terás de esperar muito... No próximo ano vais aprender a fazer uma entrevista a um doente (história clínica) e vais começar a ouvir os corações a bater...detectar sopros e sibilos, crepitações de base... vais começar e desenvolver o raciocínio clínico. Os palavrões (poliaquiúria, disartria, apraxia, hematúria, distonia...etc etc etc...) daqui a pouco serão a forma mais correcta de falar e mais inevitável... Vais começar o curso de Medicina no proximo ano, por isso não desistas agora.
      Obviamente, não podes ir para o hospital sem saber o mínimo de anatomia, fisiologia, histologia, etc etc e tudo isso que agora achas "uma seca" provavelmente, vais ver que será as bases de tudo o que irás aprender no futuro..e só assim faz sentido.

      Sobre o tempo, lê o novo post!
      beijinho

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